As armas com as quais temos que lutar

“É um sonho, esfregamos os nossos olhos para acreditar!”, assim se pronunciaram os arqueólogos israelenses diante do recente achado arqueológico, ocorrido na Reserva Natural de Ein Gedi e comunicado pela Israel Antiquities Authority nos primeiros dias de setembro último. Enquanto estudavam uma inscrição em tinta, bem fragmentada, numa das estalactites de uma caverna isolada e de difícil acesso sobre o penhasco em Ein Gedi, os pesquisadores depararam-se com quatro espadas e uma lança com cabo (pilo), todas bem preservadas, ao lado de peças de couro, madeira e metal; três delas tinham lâminas de ferro dentro de bainhas de madeira e mediam entre 60 a 65cm e a quarta media 45cm. A boa conservação das peças deve-se ao clima excepcionalmente quente e seco daquela região, próxima ao Mar Morto. Para os pesquisadores, “encontrar uma única espada já é raro, imagine encontrar quatro!”. De acordo com artigo publicado pelo New Studies in the Archaeology of the Judean Desert, trata-se, provavelmente, de um espólio de guerra tirado aos romanos. Segundo Eitan Klein, um dos diretores do projeto de pesquisa: “o esconderijo das espadas e do pilo em fendas profundas na caverna isolada, ao norte de Ein Gedi, indica que as armas foram retiradas como espólio de soldados romanos ou do campo de batalha, e propositadamente escondidas pelos rebeldes da Judeia para serem reutilizados”. A revolta a que se refere Eitan é a chamada Segunda Revolta Judaica, ocorrida entre os anos 132 a 135 d.C. (desconsiderando a revolta de Kitos) e a conclusão está apoiada no resultado de outras escavações em locais próximos, que trouxeram à luz moedas de bronze do mesmo período, trazendo a inscrição do nome de Bar Kokhba.

O jovem Simão Bar Kokhba, o “Filho da Estrela”, conforme apelidado pelo rabino Aquiva, ao reconhecê-lo como “Mashiach” de Israel, o messias davídico há tanto tempo esperado foi saudado como “Príncipe de Israel”, tendo proclamado a independência do Estado Judeu. Daí terem sido cunhadas moedas com seu nome e a declaração: “primeiro ano da libertação de Jerusalém” ou “primeiro ano da redenção de Israel”. Seus projetos políticos de independência e libertação do jugo romano pela força das armas caíram bem ao coração do povo oprimido depois de tantos anos de dominação. O líder guerreiro preparou e equipou tropas, usando da estratégia de pequenos grupos de guerrilhas, escondendo seus soldados nas fendas das rochas, fazendo ataques relâmpagos, tomando de sobressalto as patrulhas romanas, invadindo aldeias, confiscando cereais e recrutando jovens para o engrossamento do exército rebelde. O então imperador Adriano julgou necessário enviar para a Judeia o general Sexto Júlio Severo, dez legiões e mais um corpo auxiliar, somando cerca de cem mil homens. Sua ofensiva logrou êxito exatamente por usar as mesmas estratégias dos judeus revoltosos, até que estes chegassem à rendição. O relatório de Cássio enumera em 50 os esconderijos encontrados, 985 vilas destruídas e cerca de 580 mil judeus mortos. Não se tem conta do número de romanos e de judeus mortos pela fome. Com a Judeia totalmente destruída, judeus foram aprisionados aos milhares e vendidos no mercado de escravos. A morte prosseguiu alcançando especialmente judeus com a doença e a fome. O povo estava em total miséria e era dito que um escravo judeu valia menos do que um cavalo. Aqueles que não podiam trabalhar eram enviados aos circos para servirem de divertimento, sendo mortos sob as garras das feras ou sob a lâmina dos gladiadores. O projeto de Adriano para Jerusalém, um dos motivos principais da revolta, foi levado a termo. A cidade recebeu o nome de Élia Capitolina e os judeus foram proibidos de nela pisar. A província da Judeia teve seu nome mudado para Síria Palestina, nome afrontoso, que remete aos dois povos que mais perseguiram os judeus ao longo de sua história passada, os sírios e os filisteus (daí ‘palestina’, de ‘philistina’). A marca imposta por Adriano é injuriosamente vista até hoje, quando insistem em chamar a Terra de Israel pelo nome de palestina, quer em livros da história atual, quer cometendo o anacronismo de assim se referir à antiga Terra de Canaã, já nos dias dos patriarcas. Por fim, cultos pagãos foram institucionalizados em Jerusalém e o imperador Adriano proibiu a prática da circuncisão, equiparando-a a mutilação, édito que provocou a morte do rabino Aquiva, por sua recusa em obedecer à determinação romana. Bem antes de sua morte, no entanto, o rabino reconheceu seu erro ao declarar precipitadamente Bar Kokhba como messias de Israel, passando a chamá-lo, inclusive, de “Filho da Mentira”. O falso messias foi morto em 135 d.C. – a esperança de Israel em um messias político morria também, sobre um solo banhado com o sangue da revolta e com duas nações envoltas no luto de seus filhos e filhas. A expectativa humana revelou-se um sonho e eles precisavam, agora, lidar com suas duras perdas. Durante esse tempo, aqueles que ouviram a voz do verdadeiro Messias haviam fugido da Judeia e os fiéis espalhavam pelo mundo a mensagem do Evangelho.

Encontrar sua verdadeira guerra e evitar aquelas a que não fomos convocados por Deus revela-se em atitude sábia e preservadora da vida e da fé. No livro de Êxodo, encontramos o registro de que o Senhor não permitiu que o povo de Israel fosse para a Terra de Canaã passando pelo território dos filisteus, povo guerreiro, adestrado no manejo de armas, “porquanto Deus disse: para que, porventura, o povo não se arrependa, vendo a guerra, e tornem ao Egito” (13.17). O povo, então, rodeou pelo caminho do deserto, mesmo tendo subido do Egito armados. Ora, se estavam armados, por que evitar o caminho dos filisteus? Certamente estavam armados, mas não estavam prontos para guerrear com inimigos tão preparados. O Bom Pastor, portanto, guiou-os de maneira a que tivessem não apenas suas vidas preservadas, mas a confiança em que o Egito não seria mais uma opção para suas vidas.

O exemplo do êxodo israelita ensina-nos que o Senhor dos Exércitos cuida de Suas tropas e procura conduzir Seus combatentes de forma a que seus corações não desmaiem pelo medo e não haja quem se arrependa do Caminho Santo. Guerras, com as armas da artilharia ou com as armas da política e da ideologia, continuarão a existir: “e ouvireis de guerras e de rumores de guerras; olhai, não vos assusteis, porque é mister que isso tudo aconteça, mas ainda não é o fim” (Mateus 24.6). O importante é saber a guerra a que fomos convocados e contra quem, efetivamente, lutamos: “porque não temos que lutar contra carne e sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais”. Para tal peleja, insta conosco a Palavra, dizendo: “portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mal e, havendo feito tudo, ficar firmes” (Efésios 6.12,13).

Enquanto os arqueólogos multiplicam questões sobre a origem e o destino das espadas encontradas – quem seria seu dono? Com que propósito foram escondidas? Onde e quando foram fabricadas? – o tempo, que manteve intacto até mesmo o fi o de suas lâminas, já nos revelou a ineficácia dos artefatos, do esforço dos valentes e da revolta em si. O tempo revelou até mesmo o engano de um dedicado mestre da Lei, enquanto a fúria romana revelou-nos sua fidelidade irrestrita à Torah, pela qual deu sua vida.

A descoberta arqueológica trata de mais um testemunho do zelo humano por causas vãs. Escondidas, na fenda da rocha, descansaram por 1900 anos as armas que teriam sido inúteis também no campo de batalha. A verdadeira e vitoriosa batalha continua sendo travada, para a conquista das almas, para a proclamação do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, sabendo que “as armas da nossa milícia não são carnais, mas são poderosas em Deus para destruir fortalezas”. De outras batalhas, passemos ao largo, para que o nosso coração não desfaleça.

por Sara Alice Cavalcanti

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